terça-feira, 13 de novembro de 2012

Rousseau e a liberdade do homem




Qual a origem da desigualdade entre os homens? Será ela sancionada pela lei natural? A intenção de responder a estas questões — que foram propostas, em 1753, pela Academia de Dijon — Jean-Jacques Rousseau, afastando-se da atividade dos homens em sociedade, buscou o silêncio do campo. Ao distanciar-se em uma propriedade rural, longe dos confortos da cidade e próximo aos apelos da natureza. Vivendo um ritmo lento e imemorial em que crescem as plantas e através do qual desaparecem os animais, o filósofo tentou reviver mentalmente o estado primitivo da espécie humana. Rousseau buscava pensar a vida humana antes mesmo do advento das primeiras comunidades organizadas. Tal esforço imaginativo e criativo resultou uma obra de cunho reflexivo, que provoca inspiração para todos aqueles que procuram uma saída para as desgraças humanas: o Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens.
O homem, animal entre os animais, cuja vida situava-se como que fora do tempo, em uma comunhão integral com a natureza. Como animal, era guiado seguramente pelos instintos, e por aptidões suficientes para suprir as únicas e verdadeiras necessidades: alimentação, impulso à procriação, e o singelo amor-de-si, que ditava uma espécie de preservação da própria vida. Ao descrever este estágio da humanidade, Rousseau diz:

Os únicos bens que [o homem] conhece no universo são o alimento, uma fêmea e o repouso; os únicos males que teme são a dor e a fome; digo a dor e não a morte, pois jamais o animal saberá o que é morrer, e o conhecimento da morte e de seus terrores é uma das primeiras aquisições que o homem fez, aos se distanciar da condição animal. (Discurso sobre a desigualdade, Primeira Parte, §18).

As palavras usadas pelo filósofo nos fazem refletir sobre algumas questões fundamentais, a mais evidente delas é: de que modo ocorreu este distanciamento? De que maneira tal desligamento do fluxo natural permitiu o despertar para uma condição que era fundamental ao homem? Por que o homem é capaz de prever sua destruição iminente na morte? O animal não sabe o que significa morrer, não pode destacar do momento em que vive sua própria existência. Como homem, seguindo suas puras disposições naturais com o auxílio da imaginação, passa a colocar-se no tempo e no espaço.
A partir daí podemos notar que o ser natural é aquele em sendo um com a Natureza em seu conjunto, não podendo separar-se, enfim, em um eu que o distinga de um outro. Rousseau, caracteriza esta faculdade especificamente humana, a qual permite fugir à corrente dos instintos, de liberdade. A liberdade, então, se mostra como um desvio que provoca no homem uma possibilidade de saída para fora de si mesmo. A liberdade é condição sem a qual, o homem não seria capaz de progredir e aperfeiçoar-se, mas determina também o afastamento radical em relação à suas origens, a separação do paraíso terrestre em que se encontrava inicialmente.
Neste ponto de sua trajetória, o homem assume completamente a sua própria história e pode dispor tanto de seu passado (pelo uso da memória) como de seu futuro (no qual é capaz de projetar-se com as ações que imagina). No entanto para essa tomada de consciência foi necessário que o homem, partindo de uma vivência simples que se resolvia quase que imediatamente, se voltasse a um modo de vida mais complexo e pleno transferindo isso para o meio em que vivia. A exterioridade do contato direto com as coisas da natureza (e com os outros indivíduos) que não deixava vestígios, se desdobra em uma consciência cada vez mais complexa e plena do ambiente que o circundava.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Heidegger e o ser-para-a-morte


Segundo Heidegger, o ser humano é ser como possibilidade, como projeto, essa ideia nos induz na temporalidade. Isso não significa apenas que temos um passado e um futuro, mas que o futuro se revela como aquilo para o qual a existência é projetada e que o passado é aquilo que a existência transcende. O existir humano consiste no lançar-se contínuo às possibilidades, entre as quais se encontra a situação-limite representada pela morte. A presença se mostra como ser aberto às possibilidades, e como situação limite se depara com a morte, aquela possibilidade que dá fim a todas as outras.
A angústia é o fenômeno privilegiado, gerado pela situação limite da morte, e conduz o Dasein (presença) do impessoal para a possibilidade de ser ele mesmo. “A angústia manifesta no Dasein o ser para o poder ser mais próprio, isto é, o ser-livre para a liberdade do se-escolher-e-se-apropriar-de-si-mesmo” (HEIDEGGER citado por DUBOIS). Nesse sentido, a angústia faz do Dasein um ser de possibilidades; a partir dela ele se vê livre para escolher-se. Enquanto ser-no-mundo o Dasein é “(…) aquele que constrói, é aquele que se projeta, é poder-ser, é deixar-ser; é liberdade enquanto possibilidade” (VALE, 2008, p. 25). “Para Heidegger é indiscutível que o dasein autêntico necessita estar angustiado” (MALLMANN, 2008, p. 62).
A angústia é o movimento que dá origem a vida autêntica, transformando e modificando o ser-aí. Fazendo com que o sujeito tome as rédeas da própria vida, fazendo o seu caminho em percorrendo-o, em transformando-o. É possível que essa consciência de finitude e do ser para a morte seja condição prévia necessária para uma vida autêntica. Afinal é a partir da compreensão como ser finito e contínuo as possibilidades, que o homem pode desenvolver uma vida autêntica. Apesar da dificuldade de viver a autenticidade da vida humana expressada na angústia.