terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Aprender a duvidar - questionamentos filosóficos

""Não menos que se sabe, duvidar me apraz", afirma Dante. [...] A verdade e a razão são comuns a todos e não pertencem mais a quem as diz primeiro do que ao que as diz depois. Não é mais segundo Platão, do que segundo eu mesmo, que tal coisa se enuncia, desde que a compreendamos. [...] O proveito de nosso estudo está em nos tornamos melhores e mais avisados. É a inteligência que vê e ouve; é a inteligência que tudo se aproveita, tudo dispõe, age, domina e reina. Tudo o mais é cego, surdo e sem alma. Certamente nos tornaremos a criança servil e tímida se não lhe dermos a oportunidade de fazer algo por si. [...] saber de cor não é saber: é conservar o que se entregou a memória para guardar. Do que sabemos efetivamente, dispomos sem olhar para o modelo, sem voltar os olhos para o livro. Triste ciência a ciência puramente livresca. Platão afirma que a firmeza, a boa-fé, a sinceridade são a verdadeira filosofia. [...]
posto que a filosofia é a ciência que nos ensina a viver e que a infância como as outras idades dela podem tirar proveito, por que motivo não lha comunicaremos? [...] Buscai nela, jovens e velhos, um objetivo para vosso espírito; um alimento (sentido e esperança) [...] quem procede de outro modo parece dizer que ainda não é tempo de viver feliz, ou que já não o é."


MONTAIGNE, Ensaios. São Paulo: Nova Cultural. p. 75 - 77.



Se pensarmos bem no que Montaigne nos diz, podemos dizer que filosofar é antes de qualquer coisa aprender a viver. O filósofo é aquele que ama a sabedoria, não entendemos sabedoria como inteligência abstrata, mas como a capacidade de compreensão profunda da realidade na qual estamos inseridos. Assim, o filósofo busca uma vivência esclarecida o que possui uma relação direta com o saber viver. Dessa maneira, o filósofo procura o bem viver sabendo dar razões de suas ações e decisões.

Por isso, a filosofia não deve consistir em apresentar nenhum tipo de verdade absoluta definitiva. O objetivo principal é despertar a consciência para a reflexão aprofundada sobre a existência humana, na tentativa de ressignificar a vida através da autonomia.

O único mistério é haver quem pense no mistério...

Há Metafísica Bastante em não Pensar em NadaHá metafísica bastante em não pensar em nada. 

O que penso eu do mundo? 
Sei lá o que penso do mundo! 
Se eu adoecesse pensaria nisso. 

Que idéia tenho eu das cousas? 
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos? 
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma 
E sobre a criação do Mundo? 

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos 
E não pensar. É correr as cortinas 
Da minha janela (mas ela não tem cortinas). 

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério! 
O único mistério é haver quem pense no mistério. 
Quem está ao sol e fecha os olhos, 
Começa a não saber o que é o sol 
E a pensar muitas cousas cheias de calor. 
Mas abre os olhos e vê o sol, 
E já não pode pensar em nada, 
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos 
De todos os filósofos e de todos os poetas. 
A luz do sol não sabe o que faz 
E por isso não erra e é comum e boa. 

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores? 
A de serem verdes e copadas e de terem ramos 
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar, 
A nós, que não sabemos dar por elas. 
Mas que melhor metafísica que a delas, 
Que é a de não saber para que vivem 
Nem saber que o não sabem? 

"Constituição íntima das cousas"... 
"Sentido íntimo do Universo"... 
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada. 
É incrível que se possa pensar em cousas dessas. 
É como pensar em razões e fins 
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados 
das árvores 
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão. 

Pensar no sentido íntimo das cousas 
É acrescentado, como pensar na saúde 
Ou levar um copo à água das fontes. 

O único sentido íntimo das cousas 
É elas não terem sentido íntimo nenhum. 
Não acredito em Deus porque nunca o vi. 
Se ele quisesse que eu acreditasse nele, 
Sem dúvida que viria falar comigo 
E entraria pela minha porta dentro 
Dizendo-me, Aqui estou! 

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos 
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas, 
Não compreende quem fala delas 
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.) 

Mas se Deus é as flores e as árvores 
E os montes e sol e o luar, 
Então acredito nele, 
Então acredito nele a toda a hora, 
E a minha vida é toda uma oração e uma missa, 
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos. 

Mas se Deus é as árvores e as flores 
E os montes e o luar e o sol, 
Para que lhe chamo eu Deus? 
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar; 
Porque, se ele se fez, para eu o ver, 
Sol e luar e flores e árvores e montes, 
Se ele me aparece como sendo árvores e montes 
E luar e sol e flores, 
É que ele quer que eu o conheça 
Como árvores e montes e flores e luar e sol. 

E por isso eu obedeço-lhe, 
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?). 
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente, 
Como quem abre os olhos e vê, 
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes, 
E amo-o sem pensar nele, 
E penso-o vendo e ouvindo, 
E ando com ele a toda a hora. 

Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema V" 
Heterónimo de Fernando Pessoa

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

O movimento do mundo



"Como o menor grão de poeira é solidário de nosso sistema solar inteiro, carrega consigo neste movimento indiviso de descida que é a materialidade mesma, assim todos os seres organizados, do mais humilde ao mais elevado, desde as primeiras origens da vida até os tempos em que estamos, e em todos os lugares como em todos os tempos, só fazem tornar sensível aos olhos uma impulsão única, inversa ao movimento da matéria e, em si mesma, indivisível. Todos os seres vivos se prendem e todos cedem ao mesmo formidável impulso. O animal toma seu ponto de apoio à planta, o homem cavalga sobre a animalidade, e a humanidade inteira, no espaço e no tempo, é um imenso exército que galopa ao lado de cada um de nós, diante e atrás de nós, em um avanço comovente capaz de derrubar todas as resistências e superar muitos obstáculos, mesmo, talvez, a morte.”


- H. Bergson



Nossa humanidade como ressalta Bergson, filósofo e diplomata francês, é um grande exercício, exercício de vivência, exercício de ser. Nosso avanço é avassalador, ele promove movimentos distintos e eternos. Movimentos que não cessam, não têm fim... Simplesmente recomeçam num ciclo constante, o ciclo da vida.
Diante de todo esse movimento constante surgem as ideias, os sentimentos, as reflexões mais fundamentais. Fundamentais para nossa vida, para vida daqueles que nos cercam, para todo o mundo, numa espécie de força promotora de energias que guiam a nossa existência. Ou seja, nossas próprias forças, são capazes de gerar todo um mundo de cadências e experiências pessoais.
Vivemos buscando sempre as renovações necessárias, as quais nos motivam, nos fazem acordar todas as manhãs, nos despertam para a vida. Mas essas renovações não dependem de ninguém senão de nós mesmos. Somos máquinas incríveis, e nos recarregamos sozinhos. É claro que precisamos de companhia, do amor do próximo, queremos e carecemos do outro. No entanto o movimento vem de dentro de nós, nascemos sozinhos e morreremos sozinhos. A energia, a vontade, vem de dentro de cada um e é preciso amor para conosco, é preciso vontade de fazer. É preciso querer, não podemos mais esperar.
Uma das razões para hesitarmos em fazer algo que tem que ser feito é ninguém mais parecer incomodado com a situação. Isso se resume a algo fundamental nos seres humanos: somos animais sociais e aprendemos a forma correta de agir observando os outros. Entretanto, todas as revoluções aconteceram porque alguém decidiu fazer algo novo. Os atos dessa primeira pessoa "deram permissão" aos outros, ainda que para fazer algo que já queriam.
Vamos logo, o mundo está aí exigindo de nós uma postura, uma resposta. Vamos nos colocar, vamos viver de forma plena, vamos fazer a diferença. Sejamos esse movimento de forças que sacode a humanidade de seu esplendor. Vamos viver! Vamos ser felizes AGORA!

Um abraço aos meus novos alunos do Colégio São Judas Tadeu.